Programa de Pós-Graduação em Antropologia

A luta por um “modo de vida”: as narrativas e estratégias de enfrentamento ao racismo religioso do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana (FONSANPOTMA)

Autor(a):

Rosiane Rodrigues De Almeida


Palavras-chave:

Racismo religioso;modos de vida dos afrorreligiosos;violência étnico-religiosa;direitos civis


Resumo

A tese tem como objeto a análise das narrativas e das estratégias de mobilizações dos membros do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana (FONSANPOTMA), diante dos casos violência étnicoreligiosa, em nível nacional, que foi alterado revelando um cenário de agravamento desses conflitos.

Este trabalho constitui-se como um desdobramento da etnografia do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos do Negro da prefeitura da cidade do Rio de Janeiro (Comdedine-Rio), realizada durante o curso de mestrado em Antropologia no PPGAUFF, em relação à luta dos afrorreligiosos por garantia de direitos, buscando entender como os militantes dos movimentos negros lidavam com os casos classificados como “intolerância religiosa” perpetrados contra a Umbanda e o Candomblé.

A realização da pesquisa junto ao FONSANPOTMA possibilitou destacar a participação dos afrorreligiosos na formulação de políticas públicas nacionais voltadas aos adeptos de tradições de matrizes africana, o que resultou em processos distintos de incorporação de repertórios legais, inspirados em legislação internacional, que possibilita a produção de narrativas sobre o direito à autodeterminação como povo tradicional e não apenas por seu pertencimento religioso.

A reivindicação de direitos de proteção aos seus “modos de vida” tem como consequência o abandono de narrativas em torno das ideias de liberdade de crença e culto, ainda presente em outros grupos, o que representa uma alteração da agenda política e do campo de disputas entre afrorreligiosos e neopentecostais no país. A tese contribui para o debate sobre direitos étnico-religiosos destacando que, em primeiro lugar, não se pode falar que não há organização política dos afrorreligiosos no Brasil.

Em segundo lugar, destaca-se que as políticas públicas desenvolvidas nos últimos anos possibilitaram a construção de categorias discursivas – povos tradicionais de matriz africana – que permitiram incluir os adeptos dessas tradições na cena política nacional no que tange ao reconhecimento de alguns direitos sociais, mas que isso não representou mudanças nas garantias dos seus direitos civis, tendo em vista que as violências sofridas seguem sendo tratadas pelos órgãos estatais de segurança e justiça, como problemas de menor potencial ofensivo, revelando a existência de um racismo religioso.

Em terceiro lugar, a análise dos casos de violência étnico-religiosa no país permite perceber que as denúncias das violações nas mídias e redes sociais tem contribuído para perpetuar um quadro de estereótipos e preconceitos em relação aos afrorreligiosos, em vez de ser um canal para veicular que seus direitos civis não são respeitados pela população, nem pelo Estado.

Nesse cenário identificou-se ainda que o processo de vitimização dos afrorreligiosos não se constitui como no modelo ocidental de construção de vítimas, que pressupõe que as pessoas tenham plena consciência de seus direitos.

Por fim, conclui-se que os dados identificados na tese permitem demostrar que a violência étnico-religiosa provocada pelos autointitulados “traficantes evangélicos” tem resultado em profundas transformações nas tradições, influenciadas pelo temor das invasões e assassinatos de lideranças religiosas, chegando até ao fechamento dos terreiros e inviabilizando a reprodução de um modo de vida.


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