Boris Maia e Silva
Concurso público;Aprendizado;Conhecimento;Elites burocráticas;Burocracia estatal.
Esta tese busca descrever como os candidatos a ingressar numa carreira de elite do estado, os fiscais, adquirem os conhecimentos necessários para se submeterem às provas dos processos seletivos de admissão da administração pública – os concursos públicos – e alcançarem a aprovação. O concurso público no Brasil é um fenômeno social de grande representatividade, cuja institucionalização foi projetada como parte de políticas públicas de profissionalização e racionalização da administração pública, em diferentes momentos da história nacional.
A tese toma como objeto a preparação para os concursos, considerada como parte de uma tradição de conhecimento propedêutica. Argumenta-se que o aprendizado durante a preparação para os concursos e a frequência dos estudantes a cursos preparatórios não se refere apenas aos conteúdos das disciplinas estudadas, mas também ao domínio das técnicas de uso desse conteúdo para fins avaliativos. Além disso, verifica-se um aprendizado incidental, que não é controlado conscientemente pelos sujeitos envolvidos.
Durante a preparação para os concursos os estudantes são submetidos a um processo de subjetivação da autoridade do estado que os torna afeitos a certas concepções culturais de serviço público e de funcionário público que orientam práticas burocráticas tradicionais na administração pública brasileira. Por ocorrer de múltiplas formas (observação, interação social, etc.), os significados sobre o estado implícitos nesse processo podem resultar em convicções ou suposições negativas sobre o papel do servidor em relação à sociedade, o que revela uma dimensão da aprendizagem incidental pouco estudada, que é a da codificação de experiências que reproduzem percepções negativas sobre o estado e reforça visões da prevalência de interesses particulares em face de situações cotidianas.
A metodologia de pesquisa se baseou na observação participante em dois cursos preparatórios sediados no Estado do Rio de Janeiro, efetuada entre outubro de 2015 e dezembro de 2017, além de entrevistas com professores e sócios de cursos preparatórios, e da interação com os interlocutores através de ambientes online. Outra estratégia relevante foi a análise de materiais didáticos e o levantamento de informações históricas, a partir de fontes documentais, sobre modelos de concursos públicos anteriores.